O Espírito Santo não é tradicionalmente uma das áreas mais impactadas pela seca no país. Ainda assim, o período de estiagem— quando se observam intervalos sem ou com pouca chuva — afeta negativamente o setor agropecuário.
Nestas condições, a produção leiteira é uma das mais afetadas com o clima árido, que atinge especialmente as regiões Norte e Noroeste do Estado, que concentram boa parte do rebanho capixaba.
Ocorre que entre os meses de abril a setembro, quando a quantidade de precipitação cai sensivelmente e as temperaturas ficam mais amenas e frias, a queda na produção de leite é muito significativa.
Dados da Cooperativa Agropecuária Centro Serrana apontam que, em média, há uma diminuição entre 30 a 50% na lactação das vacas neste período anualmente, comparado aos meses de chuva (de novembro a março). Isso acontece porque a pastagem sente a estiagem e a oferta do principal alimento aos animais perde em quantidade e qualidade.
Para suprir a falta do pasto, os pecuaristas precisam dispor de alternativas na alimentação do rebanho. Uma delas é o fornecimento silagem (alimento volumoso) ao gado, que pode variar entre mistura de concentrados e outras opções proteicas.
E diante da dificuldade em encontrar uma silagem de qualidade e acessível aos produtores, a Nater Coop juntamente aos cooperados, resolveu plantar e produzir a própria.
Após análise de região, clima, topografia, localização e logística, a cooperativa plantou 84 hectares de milho, o equivalente a 84 campos de futebol, em uma área irrigada na zona rural de Pinheiros, em um projeto inédito no Estado.
O impacto foi imediato com o fornecimento do alimento volumoso aos animais: comparado ao mesmo período de 2022, houve 21% de aumento na produção de leite, acréscimo próximo a 1 milhão de litros do produto, e média de R$ 11, 7 mil reais a mais de faturamento líquido para cada pecuarista que aderiu ao programa, segundo dados preliminares da Nater Coop até setembro.
Planejamento
O corte e transformação do milharal em bolas de silo levou cerca de 20 dias, e o fornecimento aos produtores interessados na silagem ocorreu logo nos primeiros meses do período de estiagem deste ano, como cita o gerente de assistência técnica e bovinocultura da cooperativa, Filipe Ton Fialho.
“O período de estiagem é um momento que a gente tem uma demanda aquecida pelo leite porque o fornecimento aos laticínios diminui.
Quando estudamos a causa disso, notamos a ausência do volumoso por inexistir um planejamento forrageiro, algo bem trabalhado em outras regiões de bacias leiteiras, mas que aqui não é comum. Alguns produtores saem na frente e já produzem a própria silagem, porém grande parte ainda não produz em quantidade, e, principalmente, em qualidade”, aponta.
iante da identificação do principal fator de diminuição na produção de leite, partiu-se para o estágio produtivo. Segundo Fialho, cerca de 130 cooperados aderiram ao projeto, indicaram a quantidade de silagem planejada e a cooperativa forneceu o volumoso para que introduzissem na alimentação do gado.
Todo o plantio foi transformado em bolas de silo, cada uma com peso médio de 850 quilos de silagem, com destinação exclusiva ao gado leiteiro.
“Nada do milho foi perdido. São aproveitados caule, folhagem, espigas e a parte aérea da planta. Tudo foi moído, compactado em bolas e depois entregue aos produtores. Conseguimos fazer este processo rapidamente, o que é determinante para manter a qualidade da silagem. A escolha pelo milho se deu pela energia que ele é capaz de fornecer ao gado. Isso é transformado e potencializa a produção do leite pela vaca”, conta Filipe.
Resultado rápido
Ao todo, neste primeiro ano a cooperativa produziu 4,2 mil toneladas de silagem, que renderam 3.600 bolas de silo. Algumas delas foram compradas pelo produtor Eduardo Tschaen, de 50 anos.
Recente na pecuária leiteira, ele aliou a boa genética de vacas selecionadas, manejo adequado e introduziu o volumoso na alimentação das matrizes. Rapidamente viu a produção subir acima até mesmo do que esperava na propriedade que mantém em Pancas, na região Noroeste.
“Peguei umas 40 toneladas ao todo e comecei a fornecer aos animais em maio, quando começa a esfriar e o capim diminuiu em oferta. Logo no início, utilizei 10 quilos de silagem diária por cabeça, depois fui aumentando para 15 e depois 20 quilos. Esta foi sem dúvidas a melhor silagem que já forneci para minhas vacas. A qualidade era tão boa que guardei um pouco para fornecer aos animais em maior lactação, pois dá muito resultado. Com essa administração, tive volumoso para o gado até o mês passado (setembro)”, aponta o pecuarista.
Já planejando para 2024, Eduardo pretende fornecer novamente a silagem de milho aos animais quando o próximo período de estiagem chegar. Com o apoio de um veterinário, ele explica que as vacas que emprenharem neste período do ano serão os animais em lactação no próximo ciclo de seca.
“Agora é o período no qual tomamos as decisões e calculamos o quanto de silagem vamos precisar comprar. Tudo precisa ser feito com precisão, mas já tenho em mente que vou precisar na ordem de 60 a 80 toneladas, um pouco mais do que neste ano”, salienta Eduardo Tschaen.
Produtores que não tem acesso fácil à silagem de qualidade, caso do pecuarista José Miguel Fonseca de Faria, e da filha Maria Francisca, sabem bem como os animais sentem quando a oferta de pasto cai.
Na propriedade da família, no interior da Serra, na Grande Vitória, eles tentam suprir a pastagem rala com outras alternativas, mas a queda na ordenha é inevitável.
Expansão da área
Embora o ano ainda seja 2023, o processo para a produção da silagem de 2024 já começou. Segundo o gerente de assistência técnica da cooperativa, os formulários já foram distribuídos aos mais de 600 cooperados que fornecem leite a um grande laticínio de Nova Venécia (Veneza Lácteos). Este é o primeiro estágio do planejamento da área total de milho a ser plantada e transformada em silos.
A expectativa da Nater Coop é elevar o total produzido e contemplar mais produtores, superando assim a produção de leite e também os números obtidos neste primeiro ano da iniciativa com a introdução de silagem de milho pela própria cooperativa aos produtores.
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