Há pouco mais de uma semana, o Brasil celebrou uma vitória importante — e não, não tem a ver com qualquer esporte. Foi a vitória do queijo Morro Azul, de Santa Catarina, que desbancou um Gruyère Suíço e levou a honraria máxima dessa competição em São Paulo.
O Morro Azul é um queijo que já conquista pelo visual. Você corta a tampinha da iguaria, encontrada por cerca de R$ 30 em alguns supermercados, e come o queijo cremoso que tem ali dentro. “É um queijo de mofo branco”, explica Juliano Mendes, um dos atuais sócios da Pomerode Alimentos e queijeiro, ao lado de seu outro sócio e irmão, Bruno Mendes.
A seguir, confira a entrevista completa com o queijeiro e empresário, que fala sobre a criação do queijo Morro Azul, a entrada no mercado e como vê as possibilidades no Brasil.
Poderia me contar um pouco mais da história da empresa? Quando e como entraram no mercado de queijos? O que motivou vocês?
Tudo começou com cerveja, na verdade. Nós somos fundadores da cervejaria Eisenbahn, de Blumenau, que hoje faz parte do grupo Heineken. Em 2006, começamos a trabalhar a ideia de harmonizar cerveja com queijos — todo mundo, quando falava de queijos, pensava em vinhos, mas cervejas também combinam bem com queijos.
Aí começamos a estudar essa área para fazermos eventos, degustações, indicamos os melhores queijos para as nossas cervejas. Foi aí que nos apaixonamos por queijos também. Em 2008, vendemos a cervejaria e passamos a estudar a possibilidade de fazer queijos, trazendo mais cultura queijeira no mundo.
Eu e o Bruno fizemos um curso de queijos nos Estados Unidos e aí surgiu a possibilidade de comprar a Pomerode Alimentos, que só trabalhava com queijos fundidos. Foi aí que acabamos fechando negócio, em 2013, ampliando a linha de queijos fundidos, mas também com a linha de queijos Vermont, com processo de queijo normal.
Como funciona, internamente, o desenvolvimento de novos queijos? Como é o processo?
Quando a gente iniciou, começamos com queijos que já existiam na Europa. Estudamos, nos aprofundamos, erramos e acertamos. Evoluímos dessa forma e colocamos queijos no mercado com essa origem europeia. Mas, em determinado momento, percebemos que o consumidor estava valorizando o queijo desenvolvido no Brasil, com nomes regionais, não só o que existe na Europa.
Sentindo isso, e já estando mais preparados, demos o nosso primeiro passo com o Morro Azul, em 2019. De lá pra cá, desenvolvemos novas receitas, até com queijos semi-duros com casca lavada, como o Vale do Testo, que já foi muito premiado na Europa e que chegou na seleção dos 15 finalistas no Mundial do Queijo.
Qual é a história do queijo Morro Azul? Como ele foi pensado e desenvolvido?
É um queijo de mofo branco. É a família de queijos que a gente já fazia aqui, típicos da França, mas com uma cremosidade muito alta — mais alta do que brie ou Camembert. Mas, para ter essa cremosidade mais alta, a gente precisava dar uma estrutura para o queijo.
Aí colocamos uma cinta de carvalho ao redor dele. Para comer o Morro Azul, corta a tampa e come a massa dentro, bem cremosa. Nos inspiramos em um queijo suíço, o Vacherin Mont-d’Or, mas não é igual — ele tem a cremosidade e a cinta em volta, mas não é de mofo branco. Demos as nossas características, com o sabor que a gente desejava.
Como analisa, hoje, o mercado de queijos no Brasil? Estamos avançando?
O mercado de queijos está avançando no Brasil. É nítido isso. Há, hoje, uma migração do consumidor dos queijos sem muito sabor, sem muita personalidade, que são apenas um complemento para o dia a dia, para queijos mais saborosos, mais complexos, mais interessantes. Dentre esses queijos, temos alguns mais intensos, outros mais leves — mas ainda com mais sabor em comparação com esse queijo industrial.
É uma migração como a que aconteceu no mercado de cervejas, que foi daquela cerveja muito leve e sem amargor nenhum para um mercado hoje com várias marcas e estilos. É o mesmo movimento com os queijos, com aumento de oferta de produtos especiais e com mais consumidores. É uma mudança no perfil do consumidor, também com um aumento de lojas de queijistas com produtos especiais, assim como maior oferta nos mercados convencionais.
Quais as barreiras que ainda existem no mercado de queijos no Brasil?
Precisamos conquistar um consumidor que não é habituado com queijo que não seja muçarela, prato, frescal ou requeijão, despertando o interesse e o desejo nele em provar queijos autorais, brasileiros e com sabor diferente daquele do dia a dia. Outra questão é o poder aquisitivo do brasileiro.
Temos muita desigualdade social, com um público consumidor enorme, mas sem poder aquisitivo. Queijos artesanais custam mais caro. É inevitável, já que tem a ver com escala de produção. Isso acaba inibindo um pouco, ou bastante, o consumidor nesse mundo.
Também temos a barreira da logística: são poucas opções, já que o queijo precisa ser transportado com refrigeração e também com carga fracionada, como é a realidade das pequenas queijarias. Isso dificulta chegar em outras regiões.
Por fim, poderia me contar os planos de vocês para os próximos anos?
No momento, ainda estamos focados em fazer com que a Pomerode Alimentos e os queijos da linha Vermont ganhem mais relevância no mercado, fiquem mais conhecidos, além de aumentar volume de produção, ir para mais regiões e desenvolver novos produtos. Isso tudo mantém a marca viva, em evidência — e, quem sabe, ganhando mais prêmios, já que traz mais interesse dos consumidores pela marca.