Só muda o banco. A história é a mesma para todas as cooperativas e pequenos agricultores em assentamentos da reforma agrária. A busca por financiamento esbarra nas demandas, na burocracia e, mais do que tudo, nos pedidos de garantias.
Para conceder empréstimo, as instituições querem a terra como hipoteca. Os agricultores não podem oferecer isso porque se trata de espaço cedido por programa de reforma agrária. Cria-se o impasse.
“Percebemos que há gente disposta a financiar esse tipo de projeto, só precisa de canais. A estrutura para fazer isso é muito simples. É um chamamento à população para financiar a reforma agrária. É uma iniciativa que vem das cooperativas, de colocar no debate a questão da transição ecológica e justiça climática”, diz Luis Costa, diretor executivo da Finapop (Financiamento Popular para Produção de Alimentos Saudáveis).
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A empresa foi criada para ser ferramenta de captação de dinheiro para promover a transição ecológica na agricultura. Pessoas físicas podem realizar investimentos a partir de R$ 100 com remuneração pré-fixada de 11% ao ano.
É o primeiro programa coletivo desse tipo aberto pela Finapop, companhia criada em 2020. Os investidores fazem um contrato de investimento para uma dívida não conversível, modelo criado pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários) em 2022.
A expectativa da Finapop é captar R$ 8 milhões nos próximos 12 meses para projetos de cooperativas.
“A gente sempre tentou buscar [financiamento], mas nos acostumamos a encontrar muita dificuldade. Neste ano, tentamos acessar o Pronaf [Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar] com o Banco do Brasil.
A dificuldade foi muito grande e, até agora, não conseguimos. A burocracia é enorme. O Finapop nos oferece um acesso menos burocratizado de forma rápida”, afirma Paula Ribeiro Guimarães, coordenadora da Cooperativa Concentra, em Minas Gerais.
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A iniciativa concentra oito diferentes grupos com 261 agricultores assentados no estado para a produção de feijão agroecológico, além das cerca de 4.000 famílias afetadas diretamente pelo trabalho da cooperativa. Por meio de captação na Finapop, o Concentra conseguiu levantar R$ 530 mil.
O dinheiro é usado como capital de giro para pagar os cooperados e a matéria-prima usada à vista.
O processo padrão na venda para a Cohab, principal cliente da Concentra, é receber no mínimo 30 dias após a entrega da encomenda. Isso causa insegurança financeira para quem produz. Ela consegue, com a captação de investidores individuais, adiantar o dinheiro para os agricultores.
Para ser aprovado, a cooperativa precisa apresentar à Finapop um plano de negócios e infraestrutura e provar capacidade de pagamento. O projeto deve ser destinado para produção de alimentos e transição agroecológica. Não são financiadas cooperativas que usam transgênicos ou planejam uso do dinheiro para comprar insumos químicos.
Também não são considerados projetos individuais ou de empresas. É necessário ser um processo cooperado ou de associação. Todos os territórios são de reforma agrária.
O projeto da Cooperativa Copavi, no interior do Paraná, está em fase de captação até o final de janeiro de 2025. A ideia é arrecadar R$ 2,6 milhões para investir no setor de laticínios, aumentar a capacidade de industrialização e obter registro federal. Os cooperados planejam saltar a produção de leite de 100 mil litros anuais para 1,2 milhão.
“Por enquanto, só comercializamos no município de Paranacity porque temos apenas o SIM [Serviço de Inspeção Municipal). Possuímos pequeno laticínio que industrializa o leite pasteurizado e iogurte. Vendemos em garrafinhas para o mercado local e escolas”, explica Leticia Pellenz, médica veterinária e responsável técnica pelo setor de laticínios da cooperativa.
O financiamento da Copavi se encaixa na linha chamada de Capex da Finapop, com o propósito de aprimorar agroindústrias por meio da construção, reforma, expansão de instalação e aquisição de maquinário. Há também o dinheiro disponibilizado para capital de giro. O último é chamado de capital semente: usado para o desenvolvimento de novas iniciativas inclusivas e ao avanço de associações e cooperativas.
Pelos dados do Incra, há cerca de 1 milhão de famílias cadastradas em assentamentos de reforma agrária no país. No ano passado, foram inseridas 50.592 novas famílias.
Os financiamentos disponibilizados pelo Finapop começam a remunerar os investidores a partir do 13º mês, quando as cooperativas precisam começar a devolver o dinheiro recebido. Isso acontece pelos 48 meses seguintes.
“Este é um exemplo de como o povo pode se organizar para fortalecer aquilo que faz bem para a sociedade: alimento saudável, cooperação e agroecologia. Conseguimos R$ 180 mil para capital de giro e adquirimos café saca verde.
Temos planos para novas buscas porque estamos ampliando, procurando novos mercados. Para isso, temos de ampliar estruturas e adquirir mais café”, afirma Ester Hoffmann, coordenadora da Cooperativa Camponesa, que reúne acampamentos e assentamentos do MST em Campo do Meio e Guapé, em Minas Gerais.
A Camponesa produz o café orgânico da marca Guaii. São mil hectares para o plantio dos grãos e produção de goiabada, amendoim, mel e farinha de milho crioulo.
O discurso de Ester se repete em outras cooperativas que conseguiram financiamentos de pessoas físicas. Há o interesse em buscar mais dinheiro nesse mercado em nome da expansão da transição agroecológica.