Leite materno entrou no radar de fisiculturistas e frequentadores de academias como a mais nova — e controversa — aposta para ganhar massa muscular.
Sempre em busca de atalhos para aumentar força e volume, alguns praticantes de musculação passaram a consumir leite materno acreditando que ele poderia ser mais eficaz do que o leite de vaca ou suplementos tradicionais à base de proteína.
A ideia não surgiu dentro das academias, mas ganhou força na internet. Plataformas especializadas na venda de leite humano, originalmente criadas para conectar mães doadoras a famílias que não conseguem amamentar, passaram a ser usadas também por adultos interessados em “turbiná-lo” como suplemento alimentar. Em fóruns de musculação, o leite materno é frequentemente descrito como “ouro líquido”, uma expressão comum no universo da amamentação, agora reaproveitada com outro sentido.
O argumento central dos adeptos é simples: se o leite materno é capaz de sustentar o crescimento acelerado de um bebê, por que não ajudaria também adultos a desenvolver músculos? A lógica, no entanto, não convence nutricionistas e especialistas em saúde.
Troy Martin, treinador de fitness e nutrição da TM Fitness, acompanha de perto essa tendência e relata que a crença se espalhou rapidamente entre alguns grupos de atletas amadores. Segundo ele, há quem defenda que o leite materno favoreceria o ganho de massa de forma mais eficiente do que o leite de vaca, especialmente por conter hormônios de crescimento naturais. Ainda assim, Martin é categórico: não existe pesquisa científica que sustente essa hipótese. “A ideia parece atraente, mas não há evidência de que adultos consigam qualquer vantagem muscular ao consumir leite materno”, afirma.
Do ponto de vista nutricional, o leite materno é, de fato, um alimento extremamente complexo. Ele contém vitaminas, minerais, enzimas e proteínas específicas, além de compostos bioativos que ajudam no desenvolvimento do sistema imunológico do bebê. O ponto-chave, segundo especialistas, é justamente esse: sua composição é desenhada sob medida para recém-nascidos, não para adultos submetidos a treinos de força intensos.
Uma porta-voz da British Nutrition Foundation reforça essa avaliação. De acordo com a entidade, o leite materno atende perfeitamente às necessidades de crescimento infantil, mas não foi formulado para sustentar a saúde ou o desempenho físico de adultos. “Ele não oferece benefícios comprovados adicionais quando comparado a outras fontes adequadas de proteína e energia para essa faixa etária”, explicou.
Há ainda o risco de romantizar propriedades específicas do leite humano. Estudos isolados apontam que um componente conhecido como HAMLET, presente no leite materno, demonstrou potencial em pesquisas experimentais relacionadas ao tratamento de alguns tipos de câncer. No entanto, os próprios pesquisadores alertam que isso não significa que o consumo do leite, como alimento, produza tais efeitos em adultos saudáveis.
Além da falta de evidências, o consumo de leite materno por adultos levanta questões éticas e sanitárias. Diferentemente de produtos lácteos industrializados, o leite humano vendido informalmente pode não passar por controles rígidos de qualidade, armazenamento e segurança microbiológica. Isso aumenta o risco de contaminações e transmissão de patógenos, um fator raramente discutido nos fóruns de musculação.
Para nutricionistas esportivos, a tendência revela mais sobre o comportamento do mercado fitness do que sobre ciência. Em um ambiente altamente competitivo, no qual resultados rápidos são valorizados, dietas extremas e soluções não convencionais ganham espaço com facilidade. O leite materno acaba entrando no mesmo pacote de outras modas passageiras que prometem muito e entregam pouco.
No fim das contas, especialistas concordam que não existe “atalho milagroso” para o ganho de massa muscular. Alimentação equilibrada, ingestão adequada de proteínas de fontes reconhecidas, descanso e treino bem estruturado continuam sendo os pilares do desempenho físico. O leite materno, apesar de seu valor inestimável para a infância, parece não ter lugar legítimo na dieta de adultos em busca de músculos maiores.
Como costuma acontecer no universo fitness, a novidade chama atenção, gera curiosidade e manchetes, mas dificilmente se sustenta quando confrontada com evidências científicas. Para quem treina, a recomendação permanece clara: desconfie de modismos e priorize escolhas respaldadas pela ciência.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de Oddee.com






